sábado, 5 de dezembro de 2009

Livro eletrônico vs. livro de papel

Concordo com quase tudo o que Mário Vargas Llosa disse em seu ensaio ‘A Literatura e a Vida’ do Livro ‘A Verdade das Mentiras’. O Texto é muito bom, mas houve um argumento que não me convenceu. Em um determinado momento ele se posiciona contra a possibilidade de a tela do computador vir a substituir o papel no que diz respeito às leituras realmente literárias.

Bem, posso dizer que já me deleitei com alguns poemas na tela. Apesar de nunca ter lido um romance inteiro, os únicos empecilhos verdadeiros para isso são: prejudicar a visão, falta de costume e a pouca velociade com que se lê. Pesquisas comprovam que Lê-se mais rápido no papel, contudo também existem pesquisas empenhadas em suprir essa desvantagem dos livros eletrônicos.

No entanto, pensando de forma pecuniária, dou razão a Llosa. Se a moda pegar, pode trazer problemas para quem vive de escrever. Pior do que o que as MP3 são hoje para os músicos, porque estes são convidados para fazer ‘shows’, mas aqueles não. Um problema que talvez o ‘download’ de filmes e a pirataria de forma geral já traga para cineastas.

Talvez o futuro da Literatura esteja nos blogs, mas prefiro acreditar que as formas tradicionais sobreviverão, mesmo que armazenadas em silício e expostas por feixes de elétrons e materiais fosforescentes. Gosto da definição de Marcelo Rubens Paiva, de que o blog em si é um gênero à parte e que ainda está sendo definido.



Existe também a possibilidade de as duas formas conviverem em harmonia. Em parte, pode-se dizer que é o que ocorre hoje em dia. Assim como acontece com o cinema (o lugar) e sua magia, também o papel teria essa magia. E assim como assistimos filmes baixados e vamos aos cinemas, podemos ler, ora no computador (ou, Kindle Palm Top, Ipod, etc.), ora no papel. Como já fazemos com diversos tipos de leituras, mesmo que não literárias.

Porém, o papel tem um forte opositor. Muitos criticam os danos à natureza causados por esta indústria, dentre eles Bill Gates — um dos entusiastas da nova tecnologia. Para ser sincero, não sei exatamente qual é o dano causado por esse setor e nem o quanto a substituição pelo tipo reciclado poderia amenizar a situação, mas, sem delongas, acho um argumento ecológico bastante eloquente.

Enquanto isso fico tranquilo por não precisar cortar árvores para postar aqui.

A criança em Mário Quintana

Mário Quintana é um poeta de que gosto muito, tanto que escolhi trabalhar com ele no meu projeto de monitoria. O fato de nunca ter participado da ABL, assim como Cruz e Sousa, aumenta ainda mais minha simpatia.

Seu livro de estréia, “Rua dos Cataventos”, como o próprio nome pode sugerir, é preenchido por tonalidades cotidianas e infantis. Um bom exemplo é o sexto poema.



Rua dos Cataventos VI

Na minha rua há um menininho doente.
Enquanto os outros partem para a escola,
Junto à janela, sonhadoramente,
Ele ouve o sapateiro bater sola.

Ouve também o carpinteiro, em frente,
Que uma canção napolitana engrola.
E pouco a pouco, gradativamente,
O sofrimento que ele tem se evola. . .

Mas nesta rua há um operário triste:
Não canta nada na manhã sonora
E o menino nem sonha que ele existe.

Ele trabalha silenciosamente. . .
E está compondo este soneto agora,
Pra alminha boa do menino doente. . .

(Mário Quintana)

Esse soneto, como tantos outros do livro, é de uma sensibilidade incrível. O operário triste trabalha em homenagem a uma criança enferma. Mais tarde, em entrevista a Edla Van Steen, Quintana afirmaria que essa criança era ele mesmo. Ouso dizer, com a minha ainda parca capacidade de interpretação, que existe um conflito entre o universo infantil e o mundo adulto nesse poema. Temos uma forma toda especial de ver o mundo quando somos crianças e, no processo de envelhecimento, perdemos isso aos poucos.

Note que a percepção lírica dos trabalhadores se dá através do menino enfermo e este, por sua vez, ganha vida com o labor do artífice macambúzio. É importante lembrar que envelhecimento é diferente de amadurecimento — o primeiro tem uma certa carga negativa. Muitos se tornam chatos e pragmáticos quando adultos, preocupando-se apenas com problemas práticos, mas a Poesia está aí para provar que a vida é mais do que isso.